terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Um bingo na Ilha

Outro dia fui convidado para ir a um bingo na Ilha do Governador. Não sou dado a jogos, tampouco acreditei que poderia ganhar um bom prêmio, considerando que paguei cinco reais pela cartela, mas lá fui eu. Não foi um sacrifício tão grande assim, fui de carona com alguns amigos. Entrei no carro e, no caminho, descobri que aquele seria um bingo beneficente. Senti-me até mais nobre por participar disso. Depois quase mudei de idéia.

Um primo de um conhecido meu tinha sofrido um acidente de carro quase um mês antes do bingo. O rapaz foi a uma festa, bebeu mais do que devia e, na volta, o carro capotou. Mais uma vítima da imprudência deu a sorte de não ter morrido. O rapaz ficou internado duas semanas e depois foi liberado para casa. Quando lhe perguntaram o que tinha acontecido no momento do acidente, ele disse que não sabia e até achou estranho, visto que não tinha sido a primeira vez que tinha dirigido um pouco alto.

O acidente não foi culpa da imprudência, segundo ele. Foi apenas um azar. E, para seu azar, ainda foi picado pelo mosquito da dengue. Antes de aproximar-me dele fiz o sinal da cruz. Estava convencido de que o rapaz precisava de ajuda. Cheguei a rezar por ele ainda no caminho, mas, como reza não paga à farmácia, achei boa a idéia de um bingo para ajudá-lo na compra dos remédios.

Nunca tinha ido à Ilha do Governador, talvez não tenha perdido nada, mas era uma experiência válida. Já na Ilha, passamos por um bairro razoavelmente bonitinho, com casas idênticas, ruas limpas e vazias. De repente, o carro virou à esquerda. O asfalto desapareceu e deu lugar a um chão de barro. As casas agora eram todas diferentes umas das outras. Uma branca, outra amarela, outra meio verde, algumas ainda no tijolo puro. A maioria sem muro, facilitando a sociabilização dos moradores.

Confesso que não gostei do lugar em que estava entrando e que senti medo. Pessoas mal encaradas nas esquinas, crianças soltas e correndo para todo lado, disputando o espaço com cães, gatos e algumas galinhas. Não me lembro do nome do bairro, tampouco acredito que desejaria conhecê-lo. Finalmente chegamos à casa na qual o bingo seria realizado. Chegamos uma hora antes do horário previsto, se é que isso faz diferença. Geralmente as pessoas marcam um horário e o ignoram logo depois. Quando acham que devem, simplesmente começam o evento.

Chegando à casa, cumprimentei os moradores. Eles disseram-me seus nomes e eu disse-lhes o meu. Não adiantou muito porque logo esqueci, eles eram muitos. Prefiro perguntar o nome das pessoas novamente a pronunciá-lo errado, mas ninguém se importa com isso. É difícil falar “Alfredo”? Costumo corrigir, no máximo duas vezes, depois disso adoto o novo nome com o qual me batizaram.

– Toma uma cadeira. – Estava bamba!
– Toma um copo d’água. – Gelada de doer os dentes...

Que vontade de ir embora, pena que não tinha ido sozinho. Afinal, se fui com um grupo, devo voltar com ele!

Do lugar em que me sentei no quintal pude ver a mesa na qual estavam os brindes do bingo.

1º Prêmio: Uma garrafa de uísque nacional. (duvidei da autenticidade)
2º Prêmio: Um liquidificador.
3º Prêmio: Um espremedor de frutas.
4º Prêmio: Um ferro de passar roupas.
5º Prêmio: Um jogo de talheres.

Se não fosse a garrafa de uísque, me sentiria em um chá-de-panela. Não sei de quem foi a idéia de colocar essas coisas como brinde, também não sei quem escolheu isso ou aquilo como primeiro ou quinto prêmio. Deduzo que a escolha tenha sido feita de acordo com o valor de cada produto. Enfim... Contei os minutos para que aquilo começasse e terminasse logo.

Alguns minutos se passaram e uma pick-up chegou, transportando uma máquina de lavar roupas. Ela foi estacionada bem no lugar onde as pessoas ficariam. A máquina de lavar roupas da dona da casa estava com defeito, então o técnico levou-lhe outra para ser usada durante o conserto.

A operação de retirar a máquina sobressalente e colocar a que seria consertada mais o bate-papo entre o técnico e a cliente levou uns vinte e cinco minutos. Quando o camarada tentou sair com o carro, surpresa, o carro não queria pegar. As pessoas começaram a chegar e o carro estava lá, atrapalhando. Finalmente conseguiram consertá-lo e ele desocupou o espaço.

– Pronto, gente. Pronto. Agora a festa pode começar. Foi até bom, porque quase ninguém podia chegar às 19:00h. – Disse a dona da casa aos parentes...

O pouco de lógica que tenho impede-me de marcar um evento em um horário ingrato para a maioria das pessoas que irão... Sorriso no rosto e mais um evento começa atrasado no Brasil. O importante é que começou.

O primeiro prêmio a ser sorteado foi o jogo de talheres, depois o ferro, até chegar ao uísque, o melhor prêmio. Como esperava, não ganhei nada. Estava lá só para contribuir mesmo. O bingo terminou e as pessoas emendaram em um churrasco. Definitivamente, era demais para mim. Já tinha ouvido muitas coisas das quais não gostei em relação à falta de segurança e de tranqüilidade naquele bairro. Convencidos de que não tínhamos mais nada a fazer lá, despedimo-nos das pessoas mais próximas e fomos embora.

No caminho de volta, cheguei à conclusão de que para ajudar o rapaz não precisaria ter ido lá. Poderia ter comprado a cartela e não ter ido ao bingo. Valeu pela experiência e por ter conhecido algumas pessoas em um ambiente diferente dos que costumo freqüentar, mas perdi umas quatro ou cinco horas de minha vida, isso perdi. O bingo arrecadou quase dois mil reais. O rapaz comprou o que precisava, se restabeleceu e voltou a trabalhar. Ele continua bebendo, só que agora ninguém é bobo de colocar um carro em suas mãos.

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